sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Artigo sobre Aprovação automática

 ARTIGO: APROVAÇÃO AUTOMÁTICA

“A escola pública falha na sua tarefa básica de alfabetização das crianças das camadas populares, excluindo-as precocemente de seu interior, através de mecanismos de rejeição que opera duplamente, pois a escola não aceita a criança como ela é, e a criança não aceita a escola tal qual ela funciona”. (Maria Helena de Souza Patto)

A discussão sobre a Aprovação Automática não é nova e sempre foi usada pelos governos como panaceia para resolver o problema da retenção escolar sem levar em conta as circunstâncias sociais e históricas envolvidas na questão.

A posição do SINTE/SC sobre o assunto sempre foi a defesa incondicional da oferta de uma educação de qualidade que leve em conta o desenvolvimento pleno dos/as alunos/as como sujeitos de seu tempo e de sua história, bem como, o respeito aos/as trabalhadores da educação, oferecendo a estes condições dignas de trabalho com uma jornada adequada, salário e carreira condizentes com sua importância na sociedade. Neste sentido buscamos resgatar um pouco do que historicamente foi discutido sobre a Aprovação Automática suas causas e consequências.

Internacionalmente as políticas educacionais e a questão do fracasso escolar na história da educação, no correr do século XX, foi matizada pela intensa mobilização política em torno da organização dos sistemas nacionais e regionais de ensino e da oferta de vagas nas escolas. No entanto, os sistemas mantiveram aquilo se configurava como o fracasso escolar, refletido no grande número de reprovações nas séries iniciais da educação elementar. Neste sentido vários pesquisadores observaram que o fracasso escolar insidia especialmente sobre um certo grupo social, constatado pela situação crônica da desigualdade de oportunidades escolares.

“O estudo de Forquin (1995) baseado nas pesquisas educacionais – “de que os obstáculos ao prosseguimento dos estudos estão mais especificamente relacionados à origem social e não ao talento individual e nesse contexto, tem-se expandido a discussão sobre os déficits culturais que incidem sobre certos grupos sociais, tendo em vista um currículo escolar que se pauta pelos códigos culturais de uma elite social erudita, conforme estudou Bourdieu (1999)”.

No caso do Brasil podemos afirmar que apesar dos investimentos feitos no campo da educação escolar, em busca da universalização e da democratização do ensino básico, a expansão das matrículas escolares, as iniciativas de elevação da idade de obrigatoriedade escolar e a extensão de séries da educação elementar, que vimos acontecer no correr do século XX – não impediram a permanência do fracasso escolar de uma representativa camada da população de alunos/as das escolas públicas brasileiras.

As políticas de não reprovação ou da promoção automática aparecem, inicialmente, na Primeira República quando, em 1918, foi publicada a carta aberta de Sampaio Dória intitulada: “Contra o analphabetismo”. Destacando os elevados índices de reprovação em São Paulo, ele propõe um “novo tipo de escola alfabetizante” sugerindo “promover do primeiro para o segundo período todos os alunos que tiverem tido o benefício de um ano escolar, só podendo os atrasados repetir o ano, se não houver candidatos aos lugares que ficariam ocupados”. Em decorrência da proposta de promoção automática, Sampaio Dória prevê outras medidas: simplificar o programa, gratificar professores por aluno promovido e constituir classes especiais com os atrasados e defende sua proposta afirmando que “a razão dessa proposta se deve ao fato de que numerosas crianças não conseguem vagas nas escolas afirmando que “não se deve deixar de ensinar aos melhores, aos normais só porque os alunos atrasados ficam reprovados, impedindo que se abram novas vagas”.

De certa forma o pensamento de Sampaio Dória mesmo que sob uma ótica diferente ainda se encontra dentro do cotidiano das escolas, pois como afirma Maria Helena de Souza Patto. “A escola pública falha na sua tarefa básica de alfabetização das crianças das camadas populares, excluindo-as precocemente de seu interior, através de mecanismos de rejeição que opera duplamente, pois a escola não aceita a criança como ela é, e a criança não aceita a escola tal qual ela funciona”.

No Período Desenvolvimentista – nos anos de 1950 nas Recomendações da Conferência Regional Latino-Americana sobre Educação Primária Gratuita e Obrigatória”, promovida pela (UNESCO); o documento editado pela Organização dos Estados Americanos (OEA), em 1956. reconhece a ampliação da educação primária e que repetência escolar causa um grande prejuízo financeiro e como sugestão propõe a revisão do sistema de promoções na escola primária, com o fim de torná-lo menos seletivo.

Mais recentemente, essa discussão tem envolvido acordos internacionais – como o que aconteceu na Conferência Internacional de Jomtien (1990), baseada no ideário de uma educação para todos e promovida pela UNESCO, PNUD, UNICEF e BID – e políticas que têm tido por base a avaliação de larga escala, inclusive com a implementação de sistemas de avaliação de dimensões internacionais, como o PISA (Programme for International Student Assessment), do qual o Brasil faz parte.

Como podemos observar, a discussão sobre aprovação automática não é nova e sempre teve o dedo de organismos internacionais mais preocupados com a questão econômica e o mercado financeiro. Neste contexto observamos que o que tem comandado as orientações governamentais em relação aos sistemas educacionais, a partir dos anos de 1990, apesar da ênfase no discurso da “educação para todos”, as instituições educacionais se expandiram na rede privada tornando-se uma oportunidade de negócios dentro da competitividade econômica, buscando a formação de uma mentalidade que atendesse às necessidades “da flexibilidade e da performatividade, próprias das formas contemporâneas de organização dos sistemas econômicos e políticos”.

Por outro lado, o Estado, através do discurso da qualidade e da eficiência refletido nos resultados e níveis de desempenho escolar observados através de provas e testes está impondo uma nova cultura institucional, novos perfis de atuação, novas subjetividades.

“Santos (2004), nessa mesma linha de análise, fala, então, de uma cultura do desempenho, regida por uma nova lógica – tecnicista e utilitarista – da administração escolar e que se utiliza de tecnologias de auditoria, centradas em um sistema de testes e de inspeção. A proposta não é nova; tem sido retomada em diversas políticas de mudança no sistema de avaliação; está relacionada ao interesse de diminuir a retenção dos/as alunos/as da educação básica e os prejuízos financeiros daí advindos.

Mesmo com toda a polêmica em torno dele ainda assim o assunto possibilitou a necessidade de se discutir a modificação dos métodos de trabalho pedagógico levando em conta o atendimento e a heterogeneidade dos/as alunos/as de cada classe.

Nestas novas políticas existem os desafios das diferenças entre os/as alunos/as e o volume de responsabilidade que trabalho traz o/a professor/a, pois no momento em que aceitamos a existência de diferentes interesses, estilos e ritmos de aprendizagem precisamos pensar e organizar espaços e formas de trabalho que levem em conta estas diferenças e esta não é uma tarefa fácil para os/as professores/as, pois como Ball (1997) lembra muito bem “as diferentes políticas educacionais não estabelecem como executar aquilo que propõem e, por isso, elas terão que ter, necessariamente, uma solução localizada no fazer pedagógico”. Para que isto se torne possível é preciso levar em conta também as experiências acumuladas pelos/as docentes no dia a dia das escolas.

A atual medida tomada pelo governo do estado de acabar com a Aprovação Automática neste momento, ignora a necessidade de se trabalhar com os/as alunos/as em sua integralidade, tratando precocemente os problemas desde o início sem esperar que estes alcancem a oitava série, onde o nível de dificuldades somadas durante os oito anos do Ensino Fundamental se torna algo difícil de ser superado.

Neste modelo, não poderão ser reprovados alunos nos dois primeiros anos, pois são considerados ciclos de alfabetização, e para não reter o aluno dois anos consecutivos, não existe reprovação no 4º ano. Já os alunos do 3º, 5º, 6º, 7º, 8º e 9º ano poderão ser reprovados. Sendo assim, os estudantes que hoje estão no 8º ano, no caso de reprovação, teriam que cursar 2 anos a mais para chegar ao ensino médio.

Diante disto e como profissionais que somos sabemos que as turmas nunca são heterogêneas, em todas elas encontraremos crianças com diferentes níveis de cognição e retenção de conhecimento e é imperativo que isto seja respeitado. Não aceitamos que o governo apresente um projeto que não contemple o todo, defendemos que se faça o que é feito na Finlândia onde o atendimento se dá no momento em que a criança inicia o processo escolar. Não aceitaremos também a justificativa de indisponibilidade financeira para aplicar um programa de qualidade, a sociedade merece respeito e boa aplicação dos impostos pagos.

Alertamos também para o fato de que a mesma empresa que assessorou o Rio de Janeiro na implementação do Programa meritocrático nas escolas Municipais, também presta assessoria para o estado de Santa Catarina e em 2009, quando o atual prefeito – Eduardo Paes – tomou posse, uma de suas primeiras resoluções foi abolir a aprovação automática no 2º e 3º Ciclos de Formação colocando em suspenso o 2º e o 3º Ciclos de Formação pela eliminação da aprovação automática nessas duas etapas do Ensino Fundamental, e agora o governo do estado de SC adota uma medida semelhante entendemos que não é mera coincidência.


DIRETORIA EXECUTIVA DO SINTE/SC

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