terça-feira, 27 de outubro de 2015

PARECER JURÍDICO SOBRE DIÁRIO OnLINE‏

Ofício nº. /2015                                                                                                         

Florianópolis, 16 de outubro de 2015.




Da: Assessoria Jurídica do SINTE/SC
Para: Diretoria Executiva
Assunto: Professor on line


Prezados Diretores da Executiva Estadual do SINTE/SC

Há grande controvérsia em torno da implantação do sistema informatizado denominado “Professor On Line”. Por esta razão a Assessoria Jurídica do SINTE/SC atende a pedido do Conselho Deliberativo para manifestar-se sobre as seguintes questões: (i) as atribuições do cargo de professor e a exigência da Secretaria de Estado da Educação do uso da ferramenta; (ii) procedimentos para assegurar os direitos funcionais dos professores; (iii) o processo administrativo e penalidades;

                   O “Professor On Line” pode ser uma ferramenta importante para o trabalho do professor, desde que tenha eficácia, permita a economia de tempo e disponha de agilidade em relação ao registro manual tradicional. Ainda assim, os professores não estão impedidos de registrar suas atividades, na forma escrita habitual, mediante a utilização do Diário de Classe.

1. As Atribuições do Cargo de Professor

                   O primeiro aspecto a ser analisado diz respeito a responsabilidade do regente de classe por alimentar o sistema virtual de informações. Importante considerar que a operação de dados não se constitui atividade pedagógica “stricto sensu” porque no procedimento inexiste a interação com alunos e, também, não envolve aquelas atuações destinadas ao período de hora-atividade, como por exemplo, a preparação de aulas, elaboração e correção de provas, participação de conselhos de classe, deliberativo da escola ou atividades do calendário cultural incluídos no Projeto Político Pedagógico.

                   Portanto, justificado que de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da educação, as atribuições dos regentes de classe incluam apenas as atividades estritamente pedagógicas, relacionadas com alunos ou de planejamento:

Art. 13. Os docentes incumbir-se-ão de:
I – participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino;
II – elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a proposta pedagógica do estabelecimento de ensino;
III – zelar pela aprendizagem dos alunos;
IV – estabelecer estratégias de recuperação para os alunos de menor rendimento;
V – ministrar os dias letivos e horas-aula estabelecidos, além de participar integralmente dos períodos dedicados ao planejamento, à avaliação e ao desenvolvimento profissional;
VI – colaborar com as atividades de articulação da escola com as famílias e a comunidade

                   Esta orientação foi respeitada no Plano de Carreira do Magistério de Santa Catarina. A descrição do cargo de professor, que consta do Anexo I da Lei nº 1.139/92, edificada em épocas de uso incipiente da informática, obviamente não previu especificamente a obrigação do docente manejar as ferramentas virtuais. Além disso, manteve-se alinhado com o art. 13 da Lei 9.394/96, que lhe é posterior.

 ANEXO I
DESCRIÇÃO DE CARGO
CARGO: PROFESSOR

DESCRIÇÃO DETALHADA:
- Ministrar aulas e orientar a aprendizagem do aluno;
- elaborar programas, planos de curso e de aula no que for de sua competência;
- avaliar o desempenho dos alunos atribuindo-lhes notas ou conceitos nos prazos fixados;
- cooperar com os Serviços de Orientação Educação e Supervisão Escolar;
- promover experiências de ensino e aprendizagem contribuindo para o aprimoramento da qualidade do ensino;
- participar de reunião, conselhos de classe, atividades cívicas e outras;
- promover aulas e trabalhos de recuperação com alunos que apresentam dificuldades de aprendizagem;
- seguir as diretrizes do ensino emanados do órgão superior competente;
- fornecer dados e apresentar relatórios de suas atividades;
- executar outras atividades compatíveis com o cargo.

                   Em meio a descrições minuciosas de atribuições, inseriu-se mais outras três, com razoável generalidade de termos. É praxe, aliás, para a maioria dos Planos de Carreira, a inclusão de funções inespecíficas, a fim de permitir que outras atividades sejam exigidas do servidor público. Note-se que ao mencionar a expressão “seguir as diretrizes do ensino emanados do órgão superior competente” a lei restringe-se as responsabilidades dos professores no âmbito pedagógico, sem qualquer conteúdo operacional, como é o caso do uso do “professor on Line”. Na segunda hipótese, “fornecer dados e apresentar relatórios de suas atividades”, que decorre das atividades de regência de classe, mas sem indicar um único meio exclusivo para a apresentação. Lembre-se que o Diário de Classe manual não foi extinto e, por isso, também constitui-se um instrumento legal hábil para o cumprimento daquela obrigação indicada na descrição das atribuições do cargo. Por último, a mais nebulosa de todas, “executar outras atividades compatíveis com o cargo”, deve ser interpretada restritivamente àquelas funções atinentes ao regente de classe, que não foram incluídas nos itens anteriores. Caso contrário, o conteúdo aberto da descrição permitiria exigir o cumprimento de atividades que não são compatíveis com a função do cargo de professor.

                   Portanto, o (a) professor (a) tem absoluta condição de avaliar quais das ferramentas oferecidas pela Administração Pública são mais eficientes para o registro de “dados e relatórios de atividades”, se o “professor On Line” ou o “Diário de Classe” Manual. Tudo em homenagem ao princípio da eficiência, estabelecido no art. 37 da Constituição.

                   Assim, o uso da ferramenta denominada “professor On Line” se insere na obrigação de “fornecer dados e apresentar relatórios de suas atividades”, como forma alternativa ao Diário de Classe Manual. Considera-se que ambos os recursos não são excludentes e tem a capacidade de servir como meio legalmente permitido de registrar todas as atividades pedagógicas realizadas pelo (a) professor (a).   

                   Por outro lado, a Informação COJUR nº 611/2015 aponta que a funcionalidade do sistema professor on linese resume pela ferramenta de trabalho tecnológica que insere as informações do corpo discente em tempo real no sistema de controle de dados dos alunos, fato imprescindível nos tempos de informatização do processo escolar”(sic). Para além da lacônica fundamentação jurídica, o Parecer carece da demonstração de imperatividade para a Administração Pública do acesso das informações, em tempo real, que justifique a obrigatoriedade do uso da ferramenta. Não se vislumbra, em princípio, nenhum risco ao processo pedagógico e ao desenvolvimento do aprendizado do educando, nem mesmo a transgressão das diretrizes do art. 13 da LDB e do anexo I do Plano de Carreira do Magistério.

                   Aliás, a Lei 1.139/92 dispôs ao cargo de Assistente de Educação a específica atribuição de organização de todos registros dos assentamentos dos alunos, sejam estes por meio manual ou virtual.

ANEXO II ANEXO XV Lei nº 1.139, de 28 de outubro de 1992
GRUPO: MAGISTÉRIO - MAG
DESCRIÇÃO DAS ATRIBUIÇÕES DO CARGO
DENOMINAÇÃO DO CARGO: ASSISTENTE DE EDUCAÇÃO
DESCRIÇÃO SUMÁRIA: executar serviços de organização de arquivo, preservação de documentos, coletânea de leis e escrituração de documentos escolares, registrar e manter atualizados os assentamentos funcionais dos servidores, organizar e preparar a documentação necessária para o encaminhamento de processos diversos.
DESCRIÇÃO DETALHADA:
1. coordenar e executar as tarefas da secretaria escolar;
2. organizar e manter em dia o protocolo, o arquivo escolar e o registro de assentamentos dos alunos, de forma a permitir, em qualquer época, a verificação da identidade e regularidade da vida escolar do aluno e a autenticidade dos documentos escolares;
3. redigir e expedir toda a correspondência oficial da Unidade Escolar;
4. organizar e manter em dia a coletânea de leis, regulamentos, diretrizes, ordens de serviço, circulares, resoluções e demais documentos;
5. auxiliar na elaboração de relatórios;
6. rever todo o expediente a ser submetido a despacho do Diretor;
7. apresentar ao Diretor, em tempo hábil, todos os documentos que devem ser assinados;
8. coordenar e supervisionar as atividades referentes à matrícula, transferência, adaptação e conclusão de curso;
9. assinar juntamente com o Diretor, os documentos escolares que forem expedidos, inclusive os diplomas e certificados;
10. preparar e secretariar reuniões, quando convocado pela direção;
11. zelar pelo uso adequado e conservação dos bens materiais distribuídos à secretaria;
12. comunicar à direção toda irregularidade que venha a ocorrer na secretaria;
13. organizar e preparar a documentação necessária para o encaminhamento de processos diversos;
14. conhecer a estrutura, compreender e viabilizar o funcionamento das instâncias colegiadas na Unidade Escolar;
15. registrar e manter atualizados os assentamentos funcionais dos servidores; e executar outras atividades compatíveis com o cargo.

                   Portanto, a responsabilidade por alimentar o “sistema de controle de dados dos alunos”, consoante a Lei 1.139/92 é de incumbência do Assistente de Educação. Não se trata de uma prioridade do professor.

                   Penso que a adesão ao professo On Line será um processo natural, na medida em que o Estado disponibilizar nas unidades escolares os meios necessários para que os professores utilizem este sistema com eficácia.

2. Procedimentos para Assegurar os Direitos Funcionais

                   É preciso estar ciente que, à resistência ao uso do professor on line haverá reações adversas das GEREDs e gestores escolares. Mas, se o trabalho de professor tem-se desenvolvido no interesse da Administração Pública, ou seja, para que cumpra a determinação contida no art. 24, IX da Constituição, esta deve fornecer todos os meios necessários para a execução. Antes de tudo, essencial que o Estado ofereça aos professores todas as condições que viabilizem o melhor funcionamento do sistema "professor on line", a fim de que possam utilizar as horas de trabalho específicas para manuseio desta ferramenta. Significa dizer que tanto as condições estruturais (disponibilidade de locais e computadores), como a operacionalidade do sistema devem ser ótimas. Todavia, é sabido que há deficiências relacionadas com o fraco sinal da internet nas salas de aulas, impedindo que o sistema possa ser operado em tempo real. Por consequência, os docentes são obrigados a fazer anotações manuais das atividades e, depois, transcrevê-las para alimentar o "professor on line". É uma tarefa realizada em dobro e dispendiosa. Além disso, as escolas não dispõem de computadores ágeis e em quantidades suficientes para facilitar o trabalho dos professores.   

                   Por outro lado, os novos sistemas de informática costumam apresentar inconsistências quando ainda estão em processo de implantação. Tais problemas não podem prejudicar o professor, impondo a responsabilidade para encontrar soluções ou mesmo exigir-lhe mais tempo de trabalho, suplantando a  jornada regular (incluindo-se a hora atividade). Lembre-se que o assentamento físico das atividades pedagógicas, por meio do registro manual, não restringe ou impede o acesso à informação aos pais e alunos. 

                   Portanto, orientamos a todos que utilizam o sistema "professor on line", os seguintes procedimentos com o objetivo de assegurar os direitos funcionais:

1) o registro de todos os ingressos e saídas do sistema "professor on line", mediante a impressão de relatórios de atividades, cujo objetivo é demonstrar o tempo despendido por cada profissional com o manuseio do programa da SED, além de identificar a quantidade de dados que foram possíveis inserir;

2) o relato minucioso de todas as inconsistências do sistema, bem como apontar as dificuldades para (i) estabelecer a comunicação com o sistema da SED, (ii) inserir dados ou anexos, (iii) prestar informações, (iv) emitir relatórios e etc. O objetivo é identificar em que medida o sistema "professor on line" oferece condições mínimas de trabalho;

3) um breve inventário, registrado pela Secretaria da Escola, do número de computadores disponíveis para acesso ao sistema "professor on line" e, também o espaço físico reservado para o cumprimento da atividade; 

4) a manifestação dos órgãos deliberativos da unidade escolar (Conselho Deliberativo ou Assembleia de Pais), mediante a elaboração de ata específica, relatando os eventuais problemas e dificuldades para utilização do  sistema "professor on line", com a encaminhamento para a GERED;

5) a deliberação pela utilização do registro físico tradicional (diário de classe), quando verificada a incompatibilidade do sistema "professor on line" (sinal da internet fraco, inconsistências no programa, falta de computadores e etc);

6) na hipótese do (a) professor (a) ser questionado (a) sobre a não utilização do sistema professor on line, apresentar a resposta com base no modelo de carta elaborado pelo SINTE – Regional de Criciúma, em anexo ao parecer.

3. Processos Administrativos e Penalidades

                   Consideramos que no Estatuto do Magistério não existe tipificação como ilícito administrativo, o uso exclusivo do diário de classe para registro das atividades pedagógicas do regente de classe.  Assim, enquanto persistirem os problemas de suporte nas escolas, o (a) professor (a) pode manter o registro físico das atividades pedagógicas deixando apenas o período de hora atividade para o uso do professor On Line. Por sua vez, as Coordenações Regionais do SINTE/SC devem ter a presteza de noticiar às GEREDs e ao Ministério Público os problemas estruturais (por ex.: falta de sinal de wi-fi, ausência de capacitação dos professore) e inerentes ao sistema (por ex.: garantia de segurança, interferências na atribuição de notas e etc).

                   Para o (a) regente de classe, antes da ameaça de instauração de processo administrativo deve considerar que:
(i)                   o registro físico das atividades não significa o descumprimento de obrigações inerentes ao cargo ou decorrentes de lei;
(ii)                a demora no uso da ferramenta virtual, quando o Estado não disponibiliza equipamento eficiente, não pode ser atribuída ao professor, porque este dispõe apenas da hora atividade para fazê-lo;
(iii)               o registro on line das atividades pedagógicas está relacionada com um interesse operacional do Estado (e sob sua exclusiva responsabilidade), mas nada tem em relação ao processo do ensino-aprendizagem, que implica na relação entre professor e aluno, bem como nos deveres contratuais daquele com o Estado;
                   Da jurisprudência do TJSC pode-se colher o seguinte precedente que determinou a anulação de sanção imposta ao servidor quando a conduta imputada careceu de comprovação, fato que demonstra a violação do princípio da impessoalidade:

 AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. LIMINAR DEFERIDA PARA SUSPENDER A PENA DE DEMISSÃO. CABIMENTO DO WRIT. CONTROLE JURISDICIONAL. POSSIBILIDADE. MOTIVAÇÃO NECESSÁRIA ACERCA DOS CRITÉRIOS DA APLICAÇÃO DA PENA EM ATENÇÃO À LEGISLAÇÃO MUNICIPAL. EXISTÊNCIA DE RELEVÂNCIA DA FUNDAMENTAÇÃO E DE PERIGO DE INEFICÁCIA DA MEDIDA. ART. 7º, III, DA LEI N. 12.016/2009. DECISÃO MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO.   "(...) '[...] no que tange aos limites de atuação do Poder Judiciário no âmbito do processo administrativo disciplinar, este Superior Tribunal de Justiça, à luz dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, firmou orientação de que a pena de demissão imposta a servidor público submetido a processo administrativo disciplinar deve encontrar fundamento em provas convincentes que demonstrem, de modo cabal e indubitável, a prática da infração pelo acusado. 'Em hipóteses desse jaez, não há falar em juízo de conveniência e oportunidade da Administração, argumentando-se que a intervenção do Poder Judiciário restringir-se-ia à análise dos aspectos formais do processo disciplinar. Na verdade, em tais circunstâncias, o controle jurisdicional é amplo, no sentido de verificar se há motivação para o ato demissório, pois trata-se de providência necessária à correta observância dos aludidos postulados' (STJ, AgR no REsp n. 1034008/PA, Relª Minª Laurita Vaz)." (TJSC, Apelação Cível n. 2012.088001-0, de Chapecó, rel. Des. Jaime Ramos, j. 06-02-2014). (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2013.048665-7, de Joinville, rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, j. 25-11-2014).

                   E também, no Tribunal Regional Federal da 1ª Região:

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR. REINTEGRAÇÃO. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE ANTECIPAÇÃO DA TUTELA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. DEMISSÃO. CONTROLE PELO PODER JUDICIÁRIO. AGRAVAMENTO DA PENALIDADE. DECISÃO DESMOTIVADA. DESÍSIDA NÃO COMPROVADA. INOCORRÊNCIA DE ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL DESPROVIDAS.
(...)
6. Descabida a alegação de enriquecimento ilícito do servidor em virtude da condenação ao pagamento de todas as remunerações, desde a data do desligamento, porquanto a não prestação dos serviços não decorreu de conduta espontânea do autor, e sim de ato administrativo ilegal.
(...)
(TRF/1ª Região, AC 200439000002288, Relatora Juíza Federal Adverci Rates Mendes de Abreu, 3ª Turma Suplementar, e-DJF1 DATA:22/06/2012 PAGINA:1224)


                   Tais motivos justificam as dificuldades que o Estado terá para fazer cumprir as ameaças de punir os (as) professores (as), conforme orientação a Informação CONJUR nº 611/2015, porquanto em evidente afronta ao direito constitucional enunciado no art. 37, I viciando o processo administrativo disciplinar.

                   Ainda assim, se o Estado instaurar processo administrativo disciplinar em face do (a) professor (a), a Assessoria Jurídica do Sinte/SC se dispõe a fazer todo o acompanhamento e as defesas necessárias.

É o parecer.

Apresentamos votos de consideração e apreço.






Marcos Rogério Palmeira
OAB/SC 8.095

Assessoria Jurídica do SINTE/SC

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