Desde o encaminhamento a ALESC do famigerado Projeto de Lei sobre o Novo Plano de Carreira do Magistério Público, em que o Governo Estadual propõe uma ampla desestruturação dos direitos dos trabalhadores da educação estadual, a Assessoria jurídica do SINTE/SC tem recebido diversas solicitações de esclarecimento sobre vários dos dispositivos previstos naquele projeto de lei (PL).
1. O PL da Carreira do Magistério foi apresentado como Lei Complementar e não por MP
Primeiramente, há que se ressaltar tratar-se de um projeto de lei complementar, que deverá seguir o rito legislativo previsto e tramitar pelas respectivas Comissões da ALESC, com sua posterior discussão e votação em Plenário. Neste sentido, a mobilização e a luta política da categoria são essenciais para se evitar enormes prejuízos e retrocessos nos direitos historicamente conquistados pelos trabalhadores do magistério estadual, agora ceifados por esse PL. No momento, o palco de luta da categoria está no debate político e na defesa dos seus interesses junto ao Legislativo catarinense.
No plano jurídico, várias são os questionamentos sobre a possibilidade de se buscar o trancamento liminar desse PL via ação judicial, como ocorre em algumas situações em que o Governo emite Medidas Provisórias sobre temas relacionados à regime jurídico e planos de carreiras dos servidores. Ocorre que nesses casos, em geral o que se discute não é o mérito/conteúdo do projeto, mas apenas a questão formal da espécie legislativa – Medida Provisória –, o que seria expressamente vedado pela Constituição Federal e pela Constituição Estadual.
Da mesma forma, em geral antes da aprovação de um projeto de lei não se pode pleitear na Justiça o reconhecimento de uma alegada inconstitucionalidade, uma vez que ainda não há lei formalmente aprovada, havendo apenas um projeto. O que se discute na fase do projeto de lei é o cumprimento das exigências e procedimentos formais de tramitação.
Daí a importância da mobilização da categoria e da luta política junto a ALESC, pelo afastamento dos dispositivos que atentam contra os direitos históricos dos trabalhadores da educação e contra o princípio constitucional da valorização dos profissionais da educação (art. 206, V da Constituição Federal).
2. Algumas considerações jurídicas preliminares
Por outro lado, pode-se adiantar que o referido PL traz diversas previsões amplamente questionáveis do ponto de vista jurídico, e que poderão ser objeto de futuras análises mais aprofundadas, sem descartar inclusive o ingresso com demandas judiciais, a saber:
1. O parágrafo único do artigo 2º do PL refere-se aos cargos de provimento efetivo e remete aos Anexos II a VIII, o que parece não incluir os professores de nível médio e licenciatura curta. Ainda que previstos como cargos isolados, essa situação pode trazer prejuízo aos referidos profissionais, a ensejar futuras demandas, após análise mais aprofundada desse tema;
2. O artigo 3º do PL faz referência ao dia 1º de maio de 2016 para o início da aplicação da nova carreira, inclusive para fins de impacto financeiro. Mas não se pode olvidar que o artigo 5º da Lei Federal n. 11.738/2008 (Lei do Piso Nacional) é expresso ao prever que o piso salarial nacional do magistério é atualizado em janeiro de cada ano. Uma situação que poderá ser questionada futuramente pela categoria, inclusive por meio de medida judicial;
3. O artigo 6º do PL estabelece a previsão de uma sistemática de enquadramento funcional que não considera adequadamente o tempo de serviço dos servidores (tempo de serviço para enquadramento), sem descartar até situações de prejuízo por regressão, afora o claro desestímulo à qualificação profissional. A análise casuística (caso a caso) poderá revelar situações de prejuízo aos trabalhadores, o que também acabará por ensejar futuras demandas judiciais;
4. O artigo 12 do PL dispõe sobre as promoções, sendo que o seu § 2º prevê as progressões a partir de janeiro de 2017, com o período aquisitivo de 1º de fevereiro de 2014 a 31 de dezembro de 2016. Mas o seus § 3º, inciso III, prevê a perda da promoção no caso de mais de 05 (cinco) faltas injustificadas no período. Nesse sentido, não se pode admitir punição aos trabalhadores grevistas, com a perda da promoção por faltas de greve, situação que se verificada ensejará futuras ações judiciais;
5. O § 2º do artigo 18 do PL traz uma disposição claramente punitiva ao professor que não conseguir a complementação de sua carga horária de trabalho em outra unidade escolar. A punição é a diminuição de sua carga horária, até que volte a ministrar aulas nos limites da sua carga horária original. Isso não pode ser admitido como subsistente, uma vez que a ausência de aulas ou turmas em número suficiente não decorre de culpa do servidor, que fica à disposição da SED/SC durante a sua carga horária respectiva. Essas situações poderão ensejar futuras ações judiciais, no sentido de evitar que essa odiosa punição seja aplicada aos professores;
6. O artigo 19 do PL não assegura o direito à hora-atividade aos professores das séries iniciais do ensino fundamental e da educação especial, o que contraria o disposto no § 4º do artigo 2º da Lei Federal n. 11.738/2008 (Lei do Piso Nacional). Essa situação poderá ensejar novas demandas judiciais em defesa do direito à hora-atividade para esses trabalhadores da educação;
7. O artigo 28 do PL, que trata da denominada gratificação pelo exercício em classe unidocente e de educação especial, apresenta uma redação bastante equívoca (que permite mais de um sentido/entendimento). Nesse sentido, pode-se interpretar que o § 3º do artigo 28 assegura aos professores das séries iniciais do ensino fundamental e da educação especial a incorporação da referida gratificação aos seus proventos de aposentadoria, nos moldes atualmente previstos pelo artigo 13 da Lei Estadual n. 1.139/92, que exige o recebimento da gratificação pelo período mínimo de 02 (dois) anos. E esse entendimento deverá aplicado de forma retroativa aos atuais professores nessas condições, ou seja, que atualmente recebem regência de classe, sob pena de uma odiosa discriminação, que se ocorrida também poderá ensejar futuras ações judiciais.
Convém reiterar que essas são apenas considerações formuladas estritamente no campo jurídico e de forma panorâmica, preliminar e não exaustiva, sem o devido aprofundamento a ser realizado posteriormente, sendo que o momento é de mobilização e luta política da categoria, contrapondo-se àqueles graves prejuízos e ataques aos seus direitos, perpetrados por uma proposta de plano de carreira que, do ponto de vista político-pedagógico, não demonstra maiores preocupações nem com a efetiva valorização dos profissionais da educação, nem com as diretrizes básicas traçadas pela Lei Federal n. 9.394/1996 (LDB) e pela Lei Federal n. 11.738/2008 (Lei do Piso Nacional), com claros e odiosos retrocessos aos direitos funcionais e financeiros do Magistério catarinense.
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