Ofício
nº. /2015
Florianópolis, 16 de outubro de
2015.
Da: Assessoria
Jurídica do SINTE/SC
Para: Diretoria
Executiva
Assunto: Professor
on line
Prezados Diretores da
Executiva Estadual do SINTE/SC
Há grande controvérsia em torno da
implantação do sistema informatizado denominado “Professor On Line”. Por esta razão a Assessoria Jurídica do SINTE/SC atende a
pedido do Conselho Deliberativo para manifestar-se sobre as seguintes questões:
(i) as atribuições do cargo de professor e a exigência da Secretaria de Estado
da Educação do uso da ferramenta; (ii) procedimentos para assegurar os direitos
funcionais dos professores; (iii) o processo administrativo e penalidades;
O “Professor On Line” pode ser uma ferramenta
importante para o trabalho do professor, desde que tenha eficácia, permita a
economia de tempo e disponha de agilidade em relação ao registro manual
tradicional. Ainda assim, os professores não estão impedidos de registrar suas
atividades, na forma escrita habitual, mediante a utilização do Diário de
Classe.
1. As
Atribuições do Cargo de Professor
O primeiro aspecto a ser
analisado diz respeito a responsabilidade do regente de classe por alimentar o sistema
virtual de informações. Importante considerar que a operação de dados não se
constitui atividade pedagógica “stricto sensu” porque no procedimento inexiste
a interação com alunos e, também, não envolve aquelas atuações destinadas ao
período de hora-atividade, como por exemplo, a preparação de aulas, elaboração
e correção de provas, participação de conselhos de classe, deliberativo da
escola ou atividades do calendário cultural incluídos no Projeto Político
Pedagógico.
Portanto, justificado que de
acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da educação, as atribuições dos regentes
de classe incluam apenas as atividades estritamente pedagógicas, relacionadas
com alunos ou de planejamento:
Art.
13. Os docentes incumbir-se-ão de:
I –
participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino;
II –
elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a proposta pedagógica do
estabelecimento de ensino;
III –
zelar pela aprendizagem dos alunos;
IV –
estabelecer estratégias de recuperação para os alunos de menor rendimento;
V –
ministrar os dias letivos e horas-aula estabelecidos, além de participar
integralmente dos períodos dedicados ao planejamento, à avaliação e ao
desenvolvimento profissional;
VI –
colaborar com as atividades de articulação da escola com as famílias e a
comunidade
Esta
orientação foi respeitada no Plano de Carreira do Magistério de Santa Catarina.
A descrição do cargo de professor, que consta do Anexo I da Lei nº 1.139/92,
edificada em épocas de uso incipiente da informática, obviamente não previu
especificamente a obrigação do docente manejar as ferramentas virtuais. Além
disso, manteve-se alinhado com o art. 13 da Lei 9.394/96, que lhe é posterior.
ANEXO I
DESCRIÇÃO DE CARGO
CARGO: PROFESSOR
DESCRIÇÃO
DETALHADA:
-
Ministrar aulas e orientar a aprendizagem do aluno;
-
elaborar programas, planos de curso e de aula no que for de sua competência;
- avaliar o
desempenho dos alunos atribuindo-lhes notas ou conceitos nos prazos fixados;
-
cooperar com os Serviços de Orientação Educação e Supervisão Escolar;
-
promover experiências de ensino e aprendizagem contribuindo para o
aprimoramento da qualidade do ensino;
-
participar de reunião, conselhos de classe, atividades cívicas e outras;
- promover
aulas e trabalhos de recuperação com alunos que apresentam dificuldades de
aprendizagem;
- seguir as diretrizes do ensino emanados do órgão
superior competente;
- fornecer dados e apresentar relatórios de suas
atividades;
- executar outras atividades compatíveis com o cargo.
Em meio a descrições
minuciosas de atribuições, inseriu-se mais outras três, com razoável
generalidade de termos. É praxe, aliás, para a maioria dos Planos de Carreira,
a inclusão de funções inespecíficas, a fim de permitir que outras atividades
sejam exigidas do servidor público. Note-se que ao mencionar a expressão “seguir
as diretrizes do ensino emanados do órgão superior competente” a lei
restringe-se as responsabilidades dos professores no âmbito pedagógico, sem
qualquer conteúdo operacional, como é o caso do uso do “professor on Line”. Na segunda hipótese, “fornecer
dados e apresentar relatórios de suas atividades”, que decorre das
atividades de regência de classe, mas sem indicar um único meio exclusivo para
a apresentação. Lembre-se que o Diário de Classe manual não foi extinto e, por
isso, também constitui-se um instrumento legal hábil para o cumprimento daquela
obrigação indicada na descrição das atribuições do cargo. Por último, a mais
nebulosa de todas, “executar outras atividades compatíveis com o
cargo”, deve ser interpretada restritivamente àquelas funções atinentes ao
regente de classe, que não foram incluídas nos itens anteriores.
Caso contrário, o conteúdo aberto da descrição permitiria exigir o cumprimento
de atividades que não são compatíveis com a função do cargo de professor.
Portanto, o (a) professor (a)
tem absoluta condição de avaliar quais das ferramentas oferecidas pela
Administração Pública são mais eficientes para o registro de “dados e
relatórios de atividades”, se o “professor On
Line” ou o “Diário de Classe” Manual. Tudo em homenagem ao princípio da
eficiência, estabelecido no art. 37 da Constituição.
Assim, o uso da ferramenta
denominada “professor On Line” se
insere na obrigação de “fornecer dados e apresentar relatórios de suas
atividades”, como forma alternativa ao Diário de Classe Manual. Considera-se
que ambos os recursos não são excludentes e tem a capacidade de servir como
meio legalmente permitido de registrar todas as atividades pedagógicas
realizadas pelo (a) professor (a).
Por outro lado, a Informação
COJUR nº 611/2015 aponta que a funcionalidade do sistema professor on line “se
resume pela ferramenta de trabalho tecnológica que insere as informações do
corpo discente em tempo real no sistema de controle de dados dos alunos, fato
imprescindível nos tempos de informatização do processo escolar”(sic).
Para além da lacônica fundamentação jurídica, o Parecer carece da demonstração
de imperatividade para a Administração Pública do acesso das informações, em
tempo real, que justifique a obrigatoriedade do uso da ferramenta. Não se
vislumbra, em princípio, nenhum risco ao processo pedagógico e ao
desenvolvimento do aprendizado do educando, nem mesmo a transgressão das
diretrizes do art. 13 da LDB e do anexo I do Plano de Carreira do Magistério.
Aliás, a Lei 1.139/92 dispôs
ao cargo de Assistente de Educação a específica atribuição de organização de
todos registros dos assentamentos dos alunos, sejam estes por meio manual ou
virtual.
ANEXO II ANEXO XV Lei nº 1.139, de 28 de outubro de
1992
GRUPO: MAGISTÉRIO - MAG
DESCRIÇÃO DAS ATRIBUIÇÕES DO CARGO
DENOMINAÇÃO DO CARGO: ASSISTENTE DE EDUCAÇÃO
DESCRIÇÃO SUMÁRIA: executar serviços de organização de
arquivo, preservação de documentos, coletânea de leis e escrituração de
documentos escolares, registrar e manter atualizados os assentamentos
funcionais dos servidores, organizar e preparar a documentação necessária para
o encaminhamento de processos diversos.
DESCRIÇÃO DETALHADA:
1. coordenar e executar as
tarefas da secretaria escolar;
2. organizar e manter em
dia o protocolo, o arquivo escolar e o registro de assentamentos dos alunos, de
forma a permitir, em qualquer época, a verificação da identidade e regularidade
da vida escolar do aluno e a autenticidade dos documentos escolares;
3. redigir e expedir toda a correspondência oficial da
Unidade Escolar;
4. organizar e manter em dia a coletânea de leis,
regulamentos, diretrizes, ordens de serviço, circulares, resoluções e demais
documentos;
5. auxiliar na elaboração de relatórios;
6. rever todo o expediente a ser submetido a despacho
do Diretor;
7. apresentar ao Diretor, em tempo hábil, todos os
documentos que devem ser assinados;
8. coordenar e supervisionar as atividades referentes
à matrícula, transferência, adaptação e conclusão de curso;
9. assinar juntamente com o Diretor, os documentos
escolares que forem expedidos, inclusive os diplomas e certificados;
10. preparar e secretariar reuniões, quando convocado
pela direção;
11. zelar pelo uso adequado e conservação dos bens
materiais distribuídos à secretaria;
12. comunicar à direção toda irregularidade que venha
a ocorrer na secretaria;
13. organizar e preparar a documentação necessária
para o encaminhamento de processos diversos;
14. conhecer a estrutura, compreender e viabilizar o
funcionamento das instâncias colegiadas na Unidade Escolar;
15. registrar e manter atualizados os assentamentos
funcionais dos servidores; e executar outras atividades compatíveis com o
cargo.
Portanto, a responsabilidade
por alimentar o “sistema de controle de
dados dos alunos”, consoante a Lei 1.139/92 é de incumbência do
Assistente de Educação. Não se trata de uma prioridade do professor.
Penso que a adesão ao professo
On Line será um processo natural, na
medida em que o Estado disponibilizar nas unidades escolares os meios
necessários para que os professores utilizem este sistema com eficácia.
2.
Procedimentos para Assegurar os Direitos Funcionais
É preciso estar ciente que, à
resistência ao uso do professor on line
haverá reações adversas das GEREDs e gestores escolares. Mas, se o trabalho de
professor tem-se desenvolvido no interesse da Administração Pública, ou seja,
para que cumpra a determinação contida no art. 24, IX da Constituição, esta
deve fornecer todos os meios necessários para a execução. Antes de tudo,
essencial que o Estado ofereça aos professores todas as condições que viabilizem o melhor
funcionamento do sistema "professor on line", a fim de que
possam utilizar as horas de trabalho específicas para manuseio desta
ferramenta. Significa dizer que tanto as condições estruturais (disponibilidade
de locais e computadores), como a operacionalidade do sistema devem ser ótimas.
Todavia, é sabido que há deficiências relacionadas com o fraco sinal da
internet nas salas de aulas, impedindo que o sistema possa ser operado em tempo
real. Por consequência, os docentes são obrigados a fazer anotações manuais das
atividades e, depois, transcrevê-las para alimentar o "professor on
line". É uma tarefa realizada em dobro e dispendiosa. Além disso, as
escolas não dispõem de computadores ágeis e em quantidades suficientes para
facilitar o trabalho dos professores.
Por outro lado, os novos
sistemas de informática costumam apresentar inconsistências quando ainda estão
em processo de implantação. Tais problemas não podem prejudicar o
professor, impondo a responsabilidade para encontrar soluções ou mesmo
exigir-lhe mais tempo de trabalho, suplantando a jornada regular
(incluindo-se a hora atividade). Lembre-se que o assentamento físico das
atividades pedagógicas, por meio do registro manual, não restringe ou impede o
acesso à informação aos pais e alunos.
Portanto, orientamos a todos
que utilizam o sistema "professor on line", os seguintes
procedimentos com o objetivo de assegurar os direitos funcionais:
1)
o registro de todos os ingressos e saídas do sistema "professor on
line", mediante a impressão de relatórios de atividades, cujo objetivo
é demonstrar o tempo despendido por cada profissional com o manuseio do
programa da SED, além de identificar a quantidade de dados que foram possíveis
inserir;
2)
o relato minucioso de todas as inconsistências do sistema, bem como apontar as
dificuldades para (i) estabelecer a comunicação com o sistema da SED, (ii)
inserir dados ou anexos, (iii) prestar informações, (iv) emitir relatórios e
etc. O objetivo é identificar em que medida o sistema "professor
on line" oferece condições mínimas de trabalho;
3)
um breve inventário, registrado pela Secretaria da Escola, do número de
computadores disponíveis para acesso ao sistema "professor on line"
e, também o espaço físico reservado para o cumprimento da atividade;
4)
a manifestação dos órgãos deliberativos da unidade escolar (Conselho
Deliberativo ou Assembleia de Pais), mediante a elaboração de ata específica,
relatando os eventuais problemas e dificuldades para utilização
do sistema "professor on line", com a
encaminhamento para a GERED;
5)
a deliberação pela utilização do registro físico tradicional (diário de
classe), quando verificada a incompatibilidade do sistema "professor
on line" (sinal da internet fraco, inconsistências no programa, falta
de computadores e etc);
6)
na hipótese do (a) professor (a) ser questionado (a) sobre a não utilização do
sistema professor on line, apresentar
a resposta com base no modelo de carta elaborado pelo SINTE – Regional de
Criciúma, em anexo ao parecer.
3. Processos
Administrativos e Penalidades
Consideramos que no Estatuto
do Magistério não existe tipificação como ilícito administrativo, o uso
exclusivo do diário de classe para registro das atividades pedagógicas do
regente de classe. Assim, enquanto
persistirem os problemas de suporte nas escolas, o (a) professor (a) pode
manter o registro físico das atividades pedagógicas deixando apenas o período
de hora atividade para o uso do professor On
Line. Por sua vez, as Coordenações Regionais do SINTE/SC devem ter a
presteza de noticiar às GEREDs e ao Ministério Público os problemas estruturais
(por ex.: falta de sinal de wi-fi, ausência de capacitação dos professore) e
inerentes ao sistema (por ex.: garantia de segurança, interferências na
atribuição de notas e etc).
Para o (a) regente de classe,
antes da ameaça de instauração de processo administrativo deve considerar que:
(i)
o
registro físico das atividades não significa o descumprimento de obrigações
inerentes ao cargo ou decorrentes de lei;
(ii)
a
demora no uso da ferramenta virtual, quando o Estado não disponibiliza
equipamento eficiente, não pode ser atribuída ao professor, porque este dispõe
apenas da hora atividade para fazê-lo;
(iii)
o
registro on line das atividades
pedagógicas está relacionada com um interesse operacional do Estado (e sob sua
exclusiva responsabilidade), mas nada tem em relação ao processo do
ensino-aprendizagem, que implica na relação entre professor e aluno, bem como
nos deveres contratuais daquele com o Estado;
Da jurisprudência do TJSC
pode-se colher o seguinte precedente que determinou a anulação de sanção
imposta ao servidor quando a conduta imputada careceu de comprovação, fato que
demonstra a violação do princípio da impessoalidade:
AGRAVO DE
INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL.
PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. LIMINAR DEFERIDA PARA SUSPENDER A PENA DE
DEMISSÃO. CABIMENTO DO WRIT. CONTROLE JURISDICIONAL. POSSIBILIDADE. MOTIVAÇÃO NECESSÁRIA ACERCA DOS CRITÉRIOS
DA APLICAÇÃO DA PENA EM ATENÇÃO À LEGISLAÇÃO MUNICIPAL. EXISTÊNCIA DE
RELEVÂNCIA DA FUNDAMENTAÇÃO E DE PERIGO DE INEFICÁCIA DA MEDIDA. ART. 7º, III,
DA LEI N. 12.016/2009. DECISÃO MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. "(...) '[...] no que tange aos limites
de atuação do Poder Judiciário no âmbito do processo administrativo
disciplinar, este Superior Tribunal de Justiça, à luz dos princípios da
razoabilidade e da proporcionalidade, firmou orientação de que a pena de
demissão imposta a servidor público submetido a processo administrativo
disciplinar deve encontrar fundamento em provas convincentes que demonstrem, de
modo cabal e indubitável, a prática da infração pelo acusado. 'Em hipóteses
desse jaez, não há falar em juízo de conveniência e oportunidade da
Administração, argumentando-se que a intervenção do Poder Judiciário restringir-se-ia
à análise dos aspectos formais do processo disciplinar. Na verdade, em tais circunstâncias,
o controle jurisdicional é amplo, no sentido de verificar se há motivação para
o ato demissório, pois trata-se de providência necessária à correta observância
dos aludidos postulados' (STJ, AgR no REsp n. 1034008/PA, Relª Minª Laurita
Vaz)." (TJSC, Apelação Cível n. 2012.088001-0, de Chapecó, rel. Des. Jaime
Ramos, j. 06-02-2014). (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2013.048665-7, de
Joinville, rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, j. 25-11-2014).
E também, no Tribunal
Regional Federal da 1ª Região:
ADMINISTRATIVO.
SERVIDOR. REINTEGRAÇÃO. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE ANTECIPAÇÃO DA TUTELA
CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. DEMISSÃO.
CONTROLE PELO PODER JUDICIÁRIO. AGRAVAMENTO DA PENALIDADE. DECISÃO DESMOTIVADA. DESÍSIDA NÃO COMPROVADA. INOCORRÊNCIA DE ENRIQUECIMENTO
ILÍCITO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL DESPROVIDAS.
(...)
6. Descabida a
alegação de enriquecimento ilícito do servidor em virtude da condenação ao
pagamento de todas as remunerações, desde a data do desligamento, porquanto a
não prestação dos serviços não decorreu de conduta espontânea do autor, e sim
de ato administrativo ilegal.
(...)
(TRF/1ª Região,
AC 200439000002288, Relatora Juíza Federal Adverci Rates Mendes de Abreu, 3ª
Turma Suplementar, e-DJF1 DATA:22/06/2012 PAGINA:1224)
Tais motivos justificam as
dificuldades que o Estado terá para fazer cumprir as ameaças de punir os (as)
professores (as), conforme orientação a Informação CONJUR nº 611/2015,
porquanto em evidente afronta ao direito constitucional enunciado no art. 37, I
viciando o processo administrativo disciplinar.
Ainda assim, se o Estado instaurar
processo administrativo disciplinar em face do (a) professor (a), a Assessoria
Jurídica do Sinte/SC se dispõe a fazer todo o acompanhamento e as defesas necessárias.
É o parecer.
Apresentamos votos de consideração e
apreço.
Marcos Rogério Palmeira
OAB/SC 8.095
Assessoria Jurídica do SINTE/SC